Especialistas alertam para risco de acidentes no BRT Transcarioca

03/06/2014 - Jornal do Brasil

Com sinalização precária e campanha educativa ineficiente, pedestres ignoram via expressa

Jornal do Brasil
 
Os ônibus articulados do BRT Transcarioca começaram a circular na manhã desta segunda-feira (2/6) na Zona Oeste do Rio de Janeiro, um dia após a viagem inaugural feita pela presidente Dilma Rousseff no domingo (1). Por enquanto, o sistema funciona em regime experimental, no trecho da Barra da Tijuca ao Tanque, e somente até as 15h. Mesmo com os veículos trafegando pelo corredor expresso, pedestres ignoraram a canaleta exclusiva e, em alguns pontos da via pessoas andavam de skate, motocicletas e caminhavam com crianças. Especialistas alertam para graves acidentes que podem acontecer nessa fase de adaptação ao novo modal, especialmente pela sinalização precária e falta de campanha educativa por parte dos governos estadual e municipal. Vale lembrar que no BRT que já circula pela Barra da Tijuca, há um extenso histórico de atropelamentos e acidentes.

Trecho da Transcarioca, na Avenida Edgard Romero, em Madureira
Trecho da Transcarioca, na Avenida Edgard Romero, em Madureira

O secretário da Ordem Pública, Leandro Matieli, reforçou nesta segunda (2) que o novo sistema de transporte implantado na cidade visa beneficiar a população, reduzindo substancialmente o tempo do trajeto da Barra ao Aeroporto Antônio Carlos Jobim - Galeão. Já no domingo (1), enquanto a presidente Dilma percorria o trecho do Galeão à estação de Madureira, idosos, crianças, taxistas e motoqueiros trafegavam sem qualquer preocupação pela via expressa, na Avenida Edgar Romero, em Madureira, na altura da comunidade da Serrinha. Esse trecho começa a funcionar a partir da próxima quarta-feira (4/6). 

Na manhã desta segunda (2), já com o corredor expresso funcionando, pessoas ignoravam as faixas de advertência e atravessavam a pista nos locais proibidos, na Barra. Em Jacarepaguá, seis motociclistas foram encaminhados para a 28o. DP (Campinho) por agentes da Secretaria municipal da Ordem Pública (Seop) e da Guarda Municipal, porque estavam utilizando o corredor. Um dos motoristas transportava uma criança na garupa e estava sem qualquer equipamento de segurança. 

Apesar da CET-Rio ter colocado em pontos estratégicos agentes com mensagens em cartazes - "Atravesse na faixa" e "Trânsito para, o BRT não" - centenas de pedestres tentavam atravessar nos locais não permitido e que oferecem risco de atropelamento. O especialista em História Contemporânea e Assuntos Militares, Francisco Carlos Teixeira da Silva, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, acredita que a prefeitura começou tardiamente a campanha de educação no trânsito voltada para o BRT. "Não temos essa cultura no trânsito, o carioca não está acostumado com esse sistema viário. Os países desenvolvidos, como a Alemanha, quando vão implantar os seus sistemas modernos fazem excelentes campanhas e conseguem educar de forma adequada a população. Aqui no Rio, os governantes não tiveram esse cuidado com o povo", disse Teixeira. 

O especialista observa que as campanhas históricas voltadas para a economia de água, por exemplo, foram bem assimiladas pela população carioca. "Isso porque foram feitas de forma massiva e adequada, obedecendo critérios e prazos de adaptação dos moradores", esclareceu ele. Teixeira ressalta que as ações voltadas para o trânsito devem ter uma atenção maior das autoridades, porque geralmente enfrentam uma resistência maior da população. Para ser eficiente, Teixeira explica que a campanha educativa deve informar o tempo de duração das obras, quando serão inauguradas e as novas regras de trânsito, além de serem divulgadas por um longo período nos canais de comunicação e contar com peças publicitárias. "As ações do governo municipal não têm sido nesse nível e depois eles mesmos [governantes] vêm com um discurso displicente culpando a população de não ter educação no trânsito. As pessoas já estão estressadas com as mudanças recentes no sistema de mobilidade da cidade e ainda não recebem as informações necessárias para a sua segurança", destacou o especialista.

Teixeira observou ainda que os acidentes de trânsito registrados nos últimos 30 dias sempre envolveram ônibus. Na sua opinião, essa estatística é uma prova de que o governo não tem investido na educação da população e dos rodoviários, o que melhoria a qualidade de vida e segurança. "Como o trânsito está funcionando com novas ferramentas, é fundamental cursos de capacitação para os rodoviários e campanhas de educação no trânsito para a população e motoristas", disse ele. Teixeira citou exemplos de estados que adotaram essa metodologia integrada com sucesso, como o caso de Curitiba, Brasília e Porto Alegre. No caso do subúrbio do Rio, que acaba de receber o BRT Transcarioca, o especialista acredita que uma boa estratégia para educar os moradores seria palestras em clubes, escolas e igrejas, além de muita propaganda. 

O ex-diretor de Trânsito do antigo estado da Guanabara e ex-presidente da CET-Rio, Celso Franco, também alerta para possíveis acidentes que podem acontecer nos próximos dias com a abertura do novo corredor expresso. Para ele, o principal problema reside no bloqueio permanente da via, que é muito precário. Na sua avaliação, as cercas de proteção deveriam ser abertas somente nas travessias, com uma sinalização mais eficiente. "Existe um risco desnecessário para a população, porque esse projeto das grades de proteção não é dispendioso e o governo municipal ainda podia optar pelo patrocínio da iniciativa privada", disse Franco. Ele relembrou dos acidentes registrados logo depois da inauguração do corredor expresso que liga a Barra da Tijuca a Santa Cruz e Campo Grande, o TransOeste, que entrou em operação no dia 6 de junho de 2012. As estatísticas apontam para mais de 10 acidentes com 5 mortes até o início desse ano. As causas foram atropelamento de pedestres em travessias irregulares. 

Franco pega com exemplo os países "civilizados" que fazem uso de ações adequadas para educar a população no trânsito. "Tem que colocar obstáculos para as pessoas não acessarem os locais proibidos e que oferecem risco. Se na capital britânica eles fazem isso, não podemos seguir o exemplo?", destaca Franco, ainda comentando que o melhor opção viária para o Rio seria o metrô até o Aeroporto do Galeão. 

Alexandre Roujas, especialista em Transportes da Universidade Estadual do Rio de Janeiro ( UERJ), também considera que um dos maiores problemas do BRT ligando a Barra ao Galeão pode estar na segurança dos pedestres e motoristas. Para ele, as grades de proteção instaladas não são eficientes para impedir a passagem das pessoas. Ele acha que o governo deveria intensificar as campanhas educativas para o trânsito, especialmente para o novo sistema modal. Somente as propagandas que já estão sendo colocadas em prática, na análise do especialista, não garantem a segurança da população. "O ideal seria uma comunicação quase infantil, colocar mesmo o pedestre de castigo. E levar os agentes para os locais que oferecem maior risco", esclareceu ele.

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