Transoeste: liminares impedem demolição de 210 casas e lojas em favelas na Avenida das Américas no traçado do BRT

17/12/2010 - O Globo - Luiz Ernesto Magalhães


RIO - O BRT Transoeste (corredor expresso de ônibus articulados que ligará a Barra da Tijuca a Santa Cruz e Campo Grande), primeira grande obra viária que começou a ser construída na cidade para os Jogos Olímpicos de 2016, está na Justiça. Quatro liminares obtidas nas últimas semanas pelo Núcleo de Terras e Habitação da Defensoria Pública impedem a demolição de 210 casas e lojas comerciais (como bares e borracharias) em três favelas na Avenida das Américas, no Recreio, que estão no traçado da via. A última liminar foi obtida no plantão do Judiciário no fim da noite de anteontem para impedir a demolição de 30 imóveis que restaram na Vila Harmonia, localizada atrás do Recreio Shopping.

Assim como nas outras três ações, os moradores alegam pertencer a famílias estabelecidas há décadas nessas comunidades. Eles reivindicam acesso ao projeto do Transoeste para se convencerem a deixar suas casas. Segundo a prefeitura, ao todo 119 famílias (sem contar os comerciantes) viviam na Vila Harmonia e nas demais comunidades, e a resistência seria de uma minoria. Desse total, 95 famílias escolheram entre viver em casas de um condomínio do programa Minha Casa Minha Vida na Estrada dos Caboclos, em Campo Grande, ou receber indenizações da Secretaria municipal de Habitação.Bittar lembra compromisso firmado com COI

O secretário municipal de Habitação, Jorge Bittar, disse que as remoções atendem ao interesse público e são um compromisso com o Comitê Olímpico Internacional (COI). Ele lembra que o BRT Transoeste faz parte dos projetos de reorganização e racionalização do transporte público de massa. O Transoeste custará R$ 800 milhões à prefeitura. A previsão é que 220 mil passageiros sejam transportados diariamente quando as obras terminarem, em junho de 2012.

- Nós oferecemos opções para os moradores e estamos sempre dispostos a negociar. No caso de indenizações, chegamos a pagar 40% a mais pelo que os imóveis valem. Mas obviamente, ninguém se sente satisfeito de ter que sair do local onde mora. Isso acontece não apenas nas áreas informais, mas também nas formais. Em boa parte das obras viárias previstas até os Jogos de 2016 também haverá demolições de casas no asfalto - disse Bittar.

A defensora pública Adriana Britto, por sua vez, argumenta que, sem que as comunidades tenham acesso ao projeto, não pode confirmar que as remoções são necessárias. Segundo ela, uma audiência pública chegou a ser convocada na Câmara dos Vereadores para a apresentação do projeto, mas os técnicos do município não enviaram representantes. Além disso, observou a defensora, a prefeitura não prevê indenização para os comerciantes.

Adriana acrescentou que outras duas liminares impedem a demolição de 150 imóveis na Favela da Restinga e 30 na Vila Recreio 2, no sentido Barra-Guaratiba. A quarta liminar também protege a Vila Harmonia.

- A lei garante o direito à moradia. A solução ideal para essas comunidades é que não houvesse remoções. E, caso as remoções sejam indispensáveis, que os valores pagos pelos imóveis sejam justos. Ao avaliar os imóveis, a prefeitura toma como base uma regra geral para a cidade. Não leva em conta que as casas foram construídas numa área valorizada - diz a defensora.

Segundo a Secretaria de Habitação, sem contar o comércio informal, o Transoeste prevê a remoção de 523 famílias de cinco comunidades (quatro no Recreio e uma em Guaratiba), já que há necessidade de duplicar as avenidas das Américas e Dom João VI (Guaratiba). Deste total, 210 famílias concordaram em ser transferidos para dois condomínios do Minha Casa Minha Vida na Zona Oeste. Cerca de R$ 2,9 milhões foram pagos a 148 famílias que optaram por serem indenizadas (média de R$ 19.594 por imóvel). As 165 famílias restantes nas comunidades não fizeram suas escolhas.

- É muita pressão. Eu desisti de brigar porque a corda sempre arrebenta do lado mais fraco e aceitei R$ 19.150 de indenização - disse o pedreiro João Várzea da Cruz, de 45 anos, que na segunda-feira se mudará da Vila Harmonia para Pedra de Guaratiba.Com impasses judiciais, demolições a conta-gotas

A enfermeira Suely Afonso da Costa, de 53 anos, resiste a sair da Vila Harmonia:

- Os imóveis oferecidos pela prefeitura ficam muito longe de onde moramos hoje. E as indenizações são irrisórias.

Com os impasses judiciais, as demolições no Recreio passaram a ocorrer a conta-gotas. Em todas as comunidades existem casas demolidas total ou parcialmente e outras intactas. Na tarde da última quarta-feira, por exemplo, a subprefeitura da Barra da Tijuca conseguiu demolir apenas uma casa no Recreio 2.

Numa tentativa de conseguir a liberação do terreno da Vila Harmonia, funcionários da subprefeitura da Barra entregaram intimações aos moradores na tarde de quarta-feira exigindo que deixassem os imóveis até a meia-noite. Pela manhã, quando os fiscais da prefeitura chegaram com reforço policial e retroescavadeiras para demolir os imóveis, encontraram os moradores amparados pela liminar. Moradores de outras favelas da região como Vila Autódromo e Vila Taboinhas acompanhavam a movimentação.

Apesar do impasse, a Secretaria de Obras informou ontem que o cronograma do Transoeste, que inclui a construção de túnel na Grota Funda e a duplicação da Avenida das Américas, está sendo cumprido. Uma das intervenções importantes iniciadas esta semana é a instalação das primeiras vigas do novo viaduto que que ligará a Avenida Salvador Allende à Baltazar da Silveira.

Comentários